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Um passeio… longe das multidões

By Inesquecível 365 Comments

Foto: visitmadeira

Na vertente norte da Madeira, lá em cima na montanha, olhando o mar, também há levadas, e se algumas são verdadeiramente para especialistas, também as há para mortais mais limitados, no seu conhecimento, na sua técnica e nas suas capacidades físicas.

A proposta de hoje passa por ir até à Santa (Porto Moniz), para um passeio ao longo da levada da Ribeira da Janela. Trata-se de uma levada moderna, desenhada e construída para captar águas para a central hidroeléctrica da Ribeira da Janela. Aliás, o começo do percurso tem lugar junto à câmara de carga de onde sai o pipeline que alimenta as turbinas da central.

Mas o que interessa mesmo é o passeio, certo?

As vistas, ao longo de todo o percurso são magníficas. Tanto, que recomendamos que mantenha os olhos por onde anda… Quer ver a paisagem? Pois pare um pouco, vale a pena.

No início terá vistas desafogadas sobre todo o vale da Ribeira da Janela. Preste atenção ao ilhéu, na foz da ribeira, e à povoação, no outro lado do vale. Muito depressa a floresta evoluirá de uma floresta mista para uma floresta mais endémica, com muitas espécies da laurisilva. No início, o trilho será relativamente largo, e um pouco depois de começar até se alarga, mas depois passa a ser entre o estreito e o muito estreito, normalmente protegido por arames.

A infraestrutura de suporte, não só à levada propriamente dita, como as actividades que se desenrolaram em sua volta é interessante. Notem os mecanismos destinados a minimizar a quantidade de material flutuante transportado na levada, logo antes da câmara de carga e umas centenas de metros mais longe, e depois, já claramente no percurso, os motores, que davam “força” a pequenos teleféricos de apoio a explorações agrícolas.

Excepto a levada, a paisagem vai avançando por paisagens cada vez menos humanizadas. Vai atravessar um pequeno túnel, e depois outro um pouco mais longo. E é por aqui que – recomendamos – deve acabar o seu passeio. Resta-lhe regressar à câmara de carga, e ao seu carro, ou ao autocarro.

Trata-se de um passeio sem grandes dificuldades, mas que pode ser impróprio para quem sofra (muito) com vertigens. Exige também alguma atenção, nomeadamente nas partes mais estreitas.

Três pontes históricas no Funchal

By Inesquecível 4.309 Comments

foto: Madeira Antiga

No início de Janeiro a Câmara do Funchal procedeu à classificação, como de interesse municipal, de três pontes construídas bem no coração da cidade: a partir dessa data estão protegidas as pontes Nova, D Manuel e São Paulo.

As primeiras pontes do Funchal foram construídas de madeira, e permitiam às pessoas atravessar as ribeiras que cruzam a cidade – principalmente em períodos de chuva, sendo que em circunstâncias normais, e não estando as ribeiras canalizadas, se tornava muito fácil atravessá-las. De acordo com algumas fontes eram estruturas relativamente ligeiras, e algumas nem permitiriam o atravessamento de animais de maior porte. Há duas que são recordadas pela história, nomeadamente a de Santa Maria do Calhau (perto do actual mercado) e a da Cadeia (ligando, presume-se, a rua Direita à rua dos Ferreiros).

Na sequência da aluvião de 1803 é enviado para a Madeira, para canalizar as ribeiras e, na medida do possível, evitar repetições daquilo que começava a ser um desastre cíclico, o brigadeiro Reinaldo Oudinot. É na sequência do notável trabalho desenvolvido por este militar que o Funchal escapa às cheias, mas a consequência da canalização das ribeiras é que se tornam necessárias pontes: não só para substituir as antigas, de madeira, mas porque com a construção dos muros se torna necessário elevar o ponto de partida destas pontes.

A maior parte das pontes mais emblemáticas da cidade tem a sua origem assim nesta obra estruturante, e falamos especificamente das pontes de São Paulo (em São João) e Nova (sobre a ribeira de Santa Luzia). A ponte D Manuel (D Manuel de Castro) foi mandada construir por D Manuel de Portugal e Castro, que foi governador da Madeira de 1823 a 1825.

Na fotografia em anexo, veja-se aliás as pontes existentes: a Ponte Nova, a ponte do Bom Jesus, e mais longe a ponte da rua do Carmo. Só muito mais tarde é que se abriu a rua Dr Fernão de Ornelas.

E lá se passou a noite mais longa

By Inesquecível No Comments

Aos milhares. De chapéu, em chapéu, de corninhos de rena, de luzes e óculos a preceito, assim se fez a noite de Mercado. De cantorias, muitas, afinadas como se tivessem sido ensaiadas pelos milhares de pessoas durante todo o ano.

Foi bonito de ver. De cheirar as tangerinas que eram compradas nas barracas que se enfileiravam pela Rua da Boa Viagem, onde os turistas disparavam dezenas de fotos e os madeirenses faziam “selfies”.

Hoje, é dia de recolher as toneladas e toneladas de lixo acumulado ao longo da noite, que vão chegar a números astronómicos, mas que a Câmara Municipal do Funchal vai limpar e deixar a cidade de cara limpa, como se nada tivesse acontecido. Aliás, uma nota positiva desta noite é exactamente o facto de o Funchal não guardar, ao início da tarde, um único vestígio do que aconteceu durante a noite.

A noite encheu o coração de todos os que desceram à cidade e que deram as boas vindas ao Natal. Ficam aqui alguns momentos.

Desertas com programa radical e tudo incluído

By Inesquecível 439 Comments

E se quisesse passar um dia diferente com amigos ou família, entrar de kayak numa gruta nas Desertas e mergulhar com os lobos marinhos? Isso é possível, desde que para isso se queira aventurar num iate a caminho da reserva natural e ainda ser apaparicado por uma dezena de baleias-piloto que, em boa verdade, não nos largaram durante a experiência que vivi na semana passada.

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O “Gavião Madeira”, a “Madeira Radical” e o “Summerboard Diivng Centre” juntaram-se para proporcionar aos clientes, locais ou visitantes, uma experiência única. O dia passado a bordo, com bar aberto e refeições incluídas, é uma boa aposta para um dos próximos fins de semana. E recomenda-se, porque no dia em que fomos, os cetáceos vieram mostrar que o que se diz sobre a facilidade com que se encontram nos nossos mares é verdade. Não foi de todo uma má aposta, a das três empresas, porque a qualidade do serviço prestado aliada ao conforto da viagem que nos é oferecida, fala por si.

Os “pufs” espalhados na proa convidam a sentar-se e apreciar a baía do Funchal, enquanto saímos em direção à reserva. O bar está atestado, o bote amarrado, os fatos de mergulho aprumados e o kayak pronto para explorar as grutas da baía da Deserta Grande.

Em menos de meia hora reparamos na companhia. Duas, não, três, perdão, quatro baleias-piloto numa aula de meditação, ou pelo menos concentradas apenas na respiração, que as traz pachorrentamente à tona. O Gavião cala os motores, navega em silêncio para não as incomodar e os dois casais de alemães saltam dos assentos como se tivessem molas, debruçando-se na borda do veleiro, à procura do queixo e da melhor perspetiva para a máquina fotográfica. Os olhos brilham e olham para o skipper e o instrutor de mergulho como se tivessem posto ali as baleias numa operação de marketing. Deliciam-se. Disparam fotos e parecem querer atropelar-se num lugar preparado para embarcar vinte passageiros mais a tripulação fixa. Mas parece tudo pequeno quando se quer perseguir as baleias adormecidas.

Não as incomodamos. Seguimos o rumo traçado. Uma bebida fresca, um sol que teima em jogar-nos para a sombra do toldo instalado à popa.

Dali a pouco voltamos a avistá-las, já acordadas, talvez não as mesmas, como mais tarde se virá a comprovar, mas da mesma família.

Na ilha, cada vez mais nítida, à nossa frente, espera-nos a visita guiada à Reserva Natural. E o passeio de kayak e o mergulho, é só escolher. Ou fazer tudo. Lá tempo e descontração não faltam. Voltamos a avistá-las. Parecem querer indicar o caminho a quem já o conhece de olhos fechados. Rodrigo Cardoso volta a cortar motores ao Gavião Madeira e apreciamo-las de novo.

Posam para a fotografia, fazem desfile e mostram algo que se assemelha a uma coreografia, mergulhando ao mesmo tempo e aproximando-se de nós, mas depressa mudam o rumo e viram-se para o Bugio, estamos entregues.

Os mergulhadores aperaltam-se, há baptismo de mergulho a um dos alemães e é com esse que Luís Trabulo desce primeiro. Os outros seguem-no. Exploram, maravilham-se, procuram peixe, encontram raias, não deixam cair o queixo porque a máscara impede, mas excitam-se com o que veem nos mares da Reserva Natural.

Enquanto isso, exploramos a gruta com entrada de luz natural no kayak da “Madeira Radical” e abrimos o apetite para o almoço, já pronto, quando voltamos a bordo.

A salada fria e os pasteis de nata fazem um casamento perfeito entre o salgado e o doce da iguaria. Se não nos despachamos, o alemão ataca uma bandeja inteira e, a custo, meio envergonhado, aceita o quarto exemplar da espécie só encontrada a bordo. Rodrigo conta que há turistas que pedem a morada da pastelaria só para ir buscar pasteis de nata antes de voltar às origens.

Visitamos a reserva. Guia-nos o skipper, cruzamo-nos com outros visitantes, as explicações nos novos painéis até brilham ao sol, as veredas bam marcadas, o passeio cai bem depois da barrigada do almoço. Os alemães voltam ao fundo, descansam, o tempo começa a apertar e voltamos ao Funchal.

Eis que nos esperam as nossas amigas, ao que parece todas juntas. Uma dezena, mais coisa, menos coisa, perdemo-nos a contá-las, fazem uma espécie de escolta ao “Gavião” durante largos minutos, os alemães continuam a observá-las, a fazer visitas ao bar aberto e a dormir na proa, confortavelmente instalados, com destino ao fim do dia. O sol afasta-se em direção ao horizonte e na marina do Funchal, onde tudo começa e tudo acaba, começa a azáfama de arrumar as coisas, até a próxima viagem e ao próximo avistamento de cetáceos… da tribuna.

 

Quando se engarrafam as Terras do Avô

By Inesquecível 4.482 Comments

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Foi uma daquelas manhãs de sol e de calmaria no mar do norte. Não são todas, mas por algum motivo pensei que a minha visita o tinha feito vestir a preceito e esmerar-se para me mostrar o seu segredo.

Na curva da estrada antiga para o Seixal, vislumbrei a casa e as buganvílias que escorriam sobre a pérgula, o muro alto e o homem que começou toda a história que agora se conta com aromas de flores e paladares de fruta. Uvas, pois claro. As uvas que plantou nas Terras do Avô, ao longo dos degraus naturais que sobem a encosta quase vertical.

Duarte Caldeira recebe-me no local onde recebe dezenas de turistas todos os meses. O engenheiro das flores, como o conhecem muitas pessoas na ilha, orgulha-se do trabalho feito e eu deixo-me embalar na história familiar que o faz, agora, juntar-se à esposa e aos três filhos nesta odisseia que vai ser saboreada nas próximas gerações.

O vinho é o néctar que prepara há já vários anos e que agora recomenda ser degustado com as receitas da avó, a nova aposta comercial da empresa. Um almoço previamente marcado para o jardim que se debruça sobre o mar do norte com a sabedoria gastronómica da avó do engenheiro. O ensaio da empresa a que pertenceu anteriormente deixou a certeza de que a aposta pela qualidade em detrimento da quantidade era a opção certa e hoje prova-o com os elogios dos entendidos e a presença assídua nas melhores cartas de vinhos nacionais.

O Seixal tem solos diferentes do resto da ilha da Madeira. São ricos em matéria orgânica e tem ali a melhor água da ilha, proveniente da Laurissilva. Os ventos que sopram de nordeste, do mar para terra, trazem humidade que condensa nas folhas das árvores que são património mundial e a água daí resultante cai no solo, tornando-o único. À partida, a relação entre as duas coisas poderia não ter importância, mas o casamento entre ambas acaba por aparecer no vinho.

O engenheiro agrícola tem uma filha que lhe seguiu as opções académicas e outra que é guia. O filho, que lhe seguiu as pisadas na política, é também entusiasta do negócio familiar, que atravessa já as gerações e entranha-se lentamente na alma dos netos do patriarca.

O vinho, vamos ao vinho. Aos 13 hectares que se espalham em 31 parcelas, que dão origem ao rótulo que chama a atenção nas prateleiras do supermercado e que representa um avô a sair de uma pipa.

Os vinhos, feitos na Adega de São Vicente, têm uma qualidade ímpar, porque foi preocupação do engenheiro fazer algo diferente. As castas disponíveis na Madeira eram as mesmas para todos os vitivinicultores e a expressão “mais do mesmo” não o seduzia. Convidou um enólogo para ser seu consultor e conta com os conselhos do enólogo da Adega e hoje tem um ponto forte a seu favor: aproveita o melhor das castas e não adiciona nada, valorizando o melhor que os solos têm. A acidez do terreno, profundo e com muita pedra, transmitindo o travo a mineral que se descobre a cada gole. A ideia agradou o engenheiro. Não encontra comparação com vinhos vindos de outras regiões produtoras. Orgulha-se de escolher a sua uva. É sempre o último a entrar na adega, deixa os cachos amadurecerem mais e toca frequentemente a última semana de setembro, enquanto os outros produzem os seus vinhos mais cedo.

Tudo tem uma ciência. Ou uma engenharia. Não faz vinho para concursos porque discorda da forma como se inscrevem as garrafas. Os produtores preparam-se para os concursos com exemplares feitos propositadamente e não são, como devia, os jurados a comprar nas garrafeiras de venda ao público um exemplar aleatoriamente.

Sabe que tem qualidade para oferecer e que encontrou ali, para além das flores que o tornaram conhecido profissionalmente, uma forma de vida.

As Terras do Avô e o vinho que lhe deu o nome são a menina dos seus olhos. Têm sido a menina dos olhos da família e mostram que estarão ali para as próximas gerações. Já se enraizaram no Seixal e arredores, já ultrapassaram o oceano e chegaram a vários pontos da Europa e mesmo dos Estados Unidos da América. Vende muito a turistas que por ali passam em viagens organizadas e almoços agendados que podem ser apreciados pelos madeirenses.

Desde que instalou, em 1970, as primeiras estufas na Madeira, Duarte Caldeira experimentou novas culturas de quando em quando. Conforme as necessidades do mercado e a adaptação dos produtos. Foi dessa experiência acumulada que nasceu a paixão pelas novas propostas que lhe surgiam na mente.

O vinho e o espumante que se lhe seguem farão parte dos nossos futuros invernos ou verões no norte da ilha, na casa onde recebe quem quiser comer pratos caseiros, as tais receitas da avó, acompanhada pelas Terras do Avô. A não perder…

Quando a pressa é muita nem o vestido se tira.

By Inesquecível 529 Comments

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Tanta era a pressa de conhecer a Madeira e começar a lua de mel, que um casal de recém casados embarcou em Lisboa devidamente trajado. Ao chegar a bordo e com bilhete de económica na mão o pessoal de bordo achou piada e teve a cortesia de oferecer um lugar em primeira classe que como se sabe tem mais espaço para vestidos de noiva.
Sairam assim os dois, de mão dada no aeroporto do Funchal. Se os virem por ai não se esqueçam de lhes desejar muitas felicidades 🙂

Um Corsário que faz crescer água na boca

By Inesquecível 4.401 Comments

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Não é todos os dias que Cristóvão Colombo pode apreciar um bom churrasco. E, claro, o navegador ia certamente gostar de ir ver um bom Corsário. Não daqueles que vêm de navio, mas um dos lugares mais emblemáticos do Porto Santo.

Estou certa de que o navegador ia babar-se com a mousse de dois chocolates que o restaurante, inserido no complexo do Torre Praia Suite Hotel, mas aberto a todo o público. Ali, com uma vista fenomenal sobre a praia, a lua cheia que se ergue no horizonte, teria cenário perfeito para pedir a mão de Dona Filipa em casamento.

O nome do corsário acompanhou as últimas décadas do século passado e durante anos esteve moribundo no areal. Ontem, experimentei a picanha que até 14 de Outubro pode ser apreciada por todos quantos cá estiverem e neste fim de semana, com navegadores, mercadores e corsários a passear-se pela cidade, pode sempre descer até a praia e provar a iguaria.

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O Chef, brasileiro, claro está, oferece um sorriso a cada corte e vai enchendo os pratos da apetitosa carne que divide o forno com o doce abacaxi. É preciso resistir quase tão heroicamente como Colombo resistiu às tempestades para não atravessar o corredor vezes sem conta, mas a tarefa é tão difícil como desnecessária. Já diz o povo, um dia não são dias.

Quanto aos acompanhamentos, os normais nestas lides de picanha, com o feijão preto, o arroz branco, a couve e as batatas, ali a desafiarem as papilas gustativas e a quererem saltar para os pratos onde já espera a salada.

Apreciando o mar e as ondas, lá se embala a refeição, enquanto se relaxa. É isso, afinal, o Porto Santo. Uma calmaria que mesmo em ambiente de festa se consegue encontrar.

E se a picanha já for motivo suficiente para fazer a sua reserva no Corsário até 14 de Outubro (não se esqueça que vem aí o feriado e o subsídio de mobilidade para marcar a sua viagem), não resista à mousse de dois chocolates (preto e branco), que aparece à frente dos seus olhos num alguidar. Pisque os olhos duas ou três vezes e peça para o beliscarem. Não está a sonhar. Está mesmo perante um dos segredos mais bem guardados da ilha. Mais do que o slogan que vende o Porto Santo, o doce é o segredo que vai querer descobrir na ponta da colher de sobremesa.

Não deixe de marcar o seu encontro com a picanha. Vá à procura do Corsário, que este não oferece perigo. Só um dos melhores pratos que a ilha neste momento oferece.

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Três sonos e duas massagens depois… fui ao céu sem sair do Caniço

By Inesquecível 4.339 Comments

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Um dia destes, depois de regressar de férias, experimentei levantar-me antes do sol.

Às seis e meia pus-me a caminho do Caniço de Baixo, ainda a questionar o dia que me tinham preparado. Parei na entrada do Refugio dos Sonhos, no Centro de Cura Ayurveda de Birgit Moukom, que funciona no Hotel Alpino Atlântico e a partir dali deixei que cuidassem de mim. De corpo e alma, como se costuma dizer. Às sete da manhã eu e mais uma dúzia de mulheres estávamos numa sala silenciosa, onde conseguíamos ouvir a respiração umas das outras. Não sabia o que me ia acontecer no resto do dia, sabia apenas que ia ser sujeita a uma cura ayurvédica de que me tinham falado algumas semanas antes.

Em resumo: fui ao céu e nem saí do Caniço. Um dos dias mais memoráveis do meu verão. Todos nós devíamos fazer isso pelo menos uma vez por ano… aquele dia devolveu-me a energia que precisava para voltar ao trabalho.

Percebi depressa que era a única madeirense, que tive dificuldade em encontrar alguma portuguesa e que precisaria escavar escarpa abaixo para encontrar uma madeirense. É um bom começo, não reconhecer ninguém com quem pudesse passar o dia na conversa. Até porque o dia era de descanso.

Comecei a aula de ioga. Do sol, nada,. Nem sinal. Acatei as ordens murmuradas pela instrutora, imitei as outras mulheres, umas mais novas e outras bem mais velhas e deixei-me levar no primeiro momento do dia de cura.

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Vi o sol nascer, entre uns movimentos ensinados com todos os cuidados e a passagem do Lobo Marinho do outro lado da janela, a caminho do Porto Santo.

Em silêncio, arrumei o estaminé que tinha montado para a aula, tal qual as outras mulheres e rumei, pela primeira vez nesse dia, à sala de relaxamento. Só o nome já deixa qualquer um quase em off.

O pequeno-almoço era às 8 e meia e tinha algum tempo para apreciar aquela vista soberba sobre o amanhecer.
Bom, a primeira refeição do dia era composta por alimentos diferentes de uma normal, daquelas que nos habituamos a tomar, com café e tudo o que achamos ter direito. Café nem vê-lo. Chá de gengibre a acompanhar os alimentos, na sua maioria sementes, mas também compotas naturais.

Dali encaminharam-me para o médico, que me trata da saúde, literalmente. Aconselha-me esta ou aquela massagem, pergunta mil e uma coisas para que eu não passasse por nenhuma má experiência.

Nessa altura, ainda não imaginava que me ia embalar na viagem do resto do dia, mas do lado de fora do consultório já se estalavam dedos para a minha massagem. Bom, a da manhã, porque de tarde viria outra…

É aqui que começo a pensar que devíamos fazer isto uma vez por semestre e não por ano.

Numa sala iluminada com luz fraca e velas, deito-me para a massagem. Podia ter escolhido entre Mukabhyanga (massagem ayurvédica de óleo no rosto e parte superior do corpo) ou Padabhyanga (massagem ayurvédica de óleo aos pés e pernas) ou Panahasveda (massagem ayurvédica de óleo nas costas). Um pormenor… não posso dizer qual foi, porque experimentei um pouco de todas, mas garanto que qualquer uma delas é de se lhe tirar o chapéu. Aconselho vivamente a quem precisa de repor energias.

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Voltei para a sala de relaxamento. A única na Madeira cujos vidros filtram os raios ultravioleta maus e deixam apenas passar os bons. O que eu aprendi nesse dia. Sem necessidade de utilizar protector. Estava de tal forma relaxada e cheia de óleo, de roupão e pantufas, que pus despertador para o caso de a massagem começar a fazer efeito.

Uma boa decisão. O telemóvel em modo de voo, não fosse tocar e assim, um encosto breve, na espreguiçadeira. Lá está, mulher prevenida vale por duas: só me lembro do despertador ter tocado cinco minutos antes do almoço e de ter olhado para o lado e visto o casal que nem senti chegar. Curiosamente, o primeiro dos dois ou três homens que vi no hotel durante todo o dia. Mulheres, mais do que aquela dúzia com quem tinha feito ioga de manhã.

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A refeição tem chá de caninha, gengibre é coisa da receita da manhã. Saladas, hambúrguer de soja, azeitonas, comida vegetariana, nada melhor do que uma cura ayurvédica para entender o significado e a importância de tudo aquilo. As outras mulheres chegam e sentam-se, apreciam a refeição e curam-se. Mais um dia. Fico a saber que algumas vêm pela quinzena, outras uma semana, outras só o fim de semana. E há quem passe o dia…

14203559_1372594742755111_1920826779_oDe repente, vejo chegar à minha frente uma taça de morangos com natas. Depois de me ter portado tão bem ao almoço, não posso aceitar a tentação, mas depressa me explica a simpática colaboradora que as natas são vegetais e tem sementes de papoila a embelezar. Aceito.

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Deito-me mais um pouco, desta vez na espreguiçadeira do jardim. Não estou cansada, claro, mas o dia é de relaxamento e não de se preocupar. Acho que vou voltar uma vez a cada três meses. É isso. Um trimestre é o suficiente para o corpo pedir um dia daqueles e o espírito agradecer o mimo.

A meia tarde vou ter de novo ao centro nevrálgico, não sem antes ter passado pela loja do hotel onde se pode encontrar todo o tipo de pedras e de cremes para as maleitas. Já se prepara a minha segunda massagem do dia.

Do programa consta uma Abhyanga + Steam (massagem ayurvédica de óleo do corpo inteiro+banho de vapor c/ervas). A pele agradece, a massagem da manhã ainda fervilha nos poros, mas esta, já numa sala sobre o jardim e o oceano, revitaliza a íris antes de fechar os olhos e deixar-me viajar…

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Saí do Hotel quando o relógio marcava as cinco da tarde, mais coisa menos coisa. Três sonos depois e duas massagens depois, ganhei vida e energia para os próximos tempos. E a perguntar porque razão vamos para outros países à procura de curas e relaxamentos se ali a descrição foi minha companhia todo o dia. Andei de roupão e pantufas até voltar a casa, sem saber muito bem como levei o carro e quando vi o sofá estava tão relaxada que até me voltei a deitar. Faltava o mar, é certo. Mas o corpo rejuvenescido e o espírito agradecido estavam ali comigo. Não sei se chegaram ao mesmo tempo a casa, mas durante muito tempo estiveram perfeitamente alinhados.

Vim maravilhada com a equipa. Todos fazem a sua parte para que nos sintamos assim, mais coisa, menos coisa, às portas do céu. Sem ter de sair da ilha. É esse o propósito de quem atende e de quem recebe naquele local onde é suposto rejuvenescermos. Talvez seja melhor ir experimentar uma massagem por mês…