São seis os caminhos reais que atravessam a ilha, todos eles prova bem patente do esforço necessário para ultrapassar as barreiras que tornam esta ilha simultaneamente tão bela e tão difícil. A divulgação e a promoção do seu uso são a tarefa que foi assumida pela Associação do Caminho Real da Madeira, que integra um conjunto de amigos que sempre gostou de passeios a pé por toda a ilha.
O mais importante, principalmente pela sua característica mais integradora do território, assim como pela sua extensão, é o primeiro. O Caminho Real nr.23 começava e acabava no Funchal, depois de percorrer mais de 180 quilómetros em torno de toda a ilha.
Os outros são percursos mais curtos – aliás, todos juntos não são tão extensos como o primeiro, embora todos fossem importantes, e todos atravessassem terrenos difíceis. O Caminho Real (CR) 24 ia de Santana ao Funchal (passando pelas Cruzinhas, Ribeiro Frio, Poiso e Terreiro da Luta), o CR 25 de São Vicente ao Funchal (atravessando a Encumeada, o Jardim da Serra, o Estreito e Camara de Lobos), o CR 26 ia da Ponta de Sol ao vale de São Vicente (juntava-se ao CR25, passando pelos Estanquinhos), o CR 27 ia da Boaventura ao Funchal (cruzando a ilha pelo Lombo do Urzal, Boca das Torrinhas, Curral das Freiras, Eira do Serrado e Santo António) e o CR 28 ligava a Ponta de Sol a São Vicente.
Todos podem ser utilizados, embora nalguns casos o traçado original tenha sido absorvido por estradas mais modernas, e nem sempre seja seguro andar por estas estradas – o exemplo mais óbvio disso é a ligação entre a Ribeira Brava e a Serra de Água, em que nunca houve a preocupação de construir um passeio ao longo de uma estrada com características relativamente rápidas.
E todos eles permitem, hoje como sempre, uma interacção muito próxima entre residentes e viajantes, fomentando laços e encurtando distâncias. E aumentando a viabilidade de tantos negócios locais, onde é possível comprar uma refeição, encontrar um alojamento, ou trocar umas palavras.
Em muitos lugares fez-se a recuperação dos percursos originais, e em muitos casos fez-se a recuperação com os materiais e as caraterísticas originais – a pedra de basalto laminada, colocada na vertical, permitindo assim ganhos em termos de resistência à erosão, mas também ganhos em termos de atrito. Os caminhos não têm características constantes, sendo normalmente mais largos nos locais onde haveria mais tráfego, e mais estreitos nos locais onde houvesse menos, e nomeadamente onde não houvesse a necessidade de assegurar a circulação de animais de tracção.
Um exemplo claro destas características que vão mudando são os acessos ao cais de São Jorge, que são bem um testemunho da importância deste antigo porto da costa norte da Madeira.
Há ainda características que são partilhadas por todos os caminhos reais: a existência de casinhas de prazer (que permitiam a troca de informação e o contacto entre as pessoas residentes e aquelas que se deslocavam de um local para outro), os fontanários, os pontos de descanso das mercadorias, muitas vezes carregadas em ombros (e que são claramente evidentes em pontos do caminho do Monte e no caminho de Santo Antonio).
Um conjunto de membros das Associação do Caminho Real da Madeira vai percorrer, por estes dias, todo o Caminho Real nr 23, refazendo um percurso que já fizeram por mais de uma vez. O objectivo? Apreciar a calma e recuperar a serenidade, evitar o carro e o stress. E apreciar a paisagem e a simpatia das gentes da ilha. E mostrar que os Caminhos Reais podem ser um fio condutor através dos quais é possível conhecer a história, a cultura, as paisagens, os cheiros e os sabores da ilha.
Pena é que se há quem aproveite, e quem se esforce por recuperar e quem use sem estragar, também haja quem estrague, quer de forma intencional, quer por falta de cuidado.
Nos próximos dias haverá mais sobre estes percursos. Até lá, bons passeios.